Pe Ignacio Montojo
Há poucos dias, encontrava-me rezando o Rosário numa igreja de São Paulo, quando, sem me dar conta, interrompi a oração para analisar um personagem que acabava de entrar.
Pobremente vestido, seu andar e seu rosto denotavam um homem maltratado pelos anos e por duros sofrimentos. Tudo nele indicava o que no mundo de hoje se chama um “fracassado na vida”, ou, em outros termos, um “João Ninguém”: sem dinheiro, sem saúde, sem prestígio, talvez sem amigos.
Tomado de compaixão pelo pobre homem, notei com alegria que, ao passar diante do Tabernáculo, dobrou ele um dos joelhos e fez pausadamente o sinal-da-cruz. Pensei com meus botões: “Pelo menos é batizado, tem fé, é um membro da Santa Igreja.”
E mal terminei essa cogitação, dei-me conta do paradoxo nela inserido: “Pelo menos...é batizado!!!”
Quando, certo dia, um sacerdote derramou água sobre a cabeça deste pobre João Ninguém e disse: “Eu te batizo, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”, algo de muito especial aconteceu na sua alma. As três divinas pessoas da Santíssima Trindade passaram a habitá-la. Tornou-se possível para ele crer nas verdades da Santa Igreja, esperar a recompensa demasiadamente grande do Céu e amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Viu-se ele transformado em filho adotivo do Rei do Universo e herdeiro de seu maravilhoso Reino. Ficou limpo da terrível culpa de nossos primeiros pais, o pecado original, e abriram-se para ele as portas do Céu.
Sim, por efeito do Batismo, todo João Ninguém é elevado a um nível que nem o governante mais poderoso, o gênio mais brilhante, o filósofo mais erudito poderiam alcançar por sua própria natureza e méritos.
E a pessoa não-batizada, em que situação está?
Imaginemos um lindo passarinho que, entretanto, nasceu aleijado e — coitadinho! — nunca levantou vôo. Andou pelos campos e quiçá até traçou um caminho reto... Mas se não voar, que será ele em relação às outras aves?
O infortúnio desse pássaro imaginário é semelhante ao do homem não-batizado. Tal como a ave incapaz de voar, ele tem sua finalidade truncada, ainda que levando uma vida direita. Pois não possui as asas da Fé, Esperança e Caridade para cumprir a finalidade de todo ser humano, isto é, “conhecer, amar e servir a Deus e mediante isto salvar sua alma”, conforme nos ensina Santo Inácio.
Mas, poderíamos pensar, o que fez esse João Ninguém para merecer tal glória? Não haveria outros que mereceriam mais? Esta é uma pergunta baseada exclusivamente nos critérios humanos. Ninguém recebe a graça do Batismo por merecimento próprio, mas sim pelos méritos infinitos de Jesus que nasceu de Maria Virgem, padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos e foi crucificado para nos redimir. Quando na Cruz Ele, “inclinando a cabeça, entregou o espírito” (Jo 19, 30), conquistou para João Ninguém e para a humanidade inteira essa graça incomensurável.
Após estas reflexões sobre a grandeza de todo “pobre” João Ninguém, tabernáculo da Santíssima Trindade, ofereci o resto do meu Rosário para agradecer o dom imenso do Batismo, não só a Nosso Senhor Jesus Cristo, mas também a Maria, sua Mãe Santíssima, pois Ela deu seu consentimento para que seu Filho Divino morresse por nós, e contribuiu com suas lágrimas para resgatar todos os João Ninguém que passam despercebidos diante dos “grandes” do mundo.
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