Capela Sagrado Coração de Jesus - Paróquia Nossa Senhora das Graças |
Por ter muita fé, confiança e persistência, uma devota da Eucaristia obteve o que pedia. Exemplo para todos quantos querem ser ajudados. Haverá quem não o queira?
Paris, 31 de maio de 1725. Pelas ruas engalanadas do “Faubourg Saint-Antoine”, seguia majestosa a procissão do Santíssimo Sacramento.
A certa altura, um acontecimento inesperado quebrou a solenidade do augusto evento. Na porta de uma casa, uma mulher visivelmente extenuada por alguma enfermidade desvencilhou-se das amigas que a sustentavam de pé e tentou ajoelhar-se diante do Deus Sacramentado que passava.
O resultado foi desastroso: caindo ao chão, viu-se ela reduzida à humilhante situação de ficar apoiando-se nos joelhos e nas mãos.
Indiferente a tudo, porém, fixando a branca Hóstia consagrada, ela suplicava em alta voz: “Senhor! Se quiserdes, podeis curar-me!” Algumas pessoas compassivas fizeram menção de ajudá-la, mas ela, sem lhes dar atenção, insistia: “Senhor, sois o mesmo Jesus que restituiu a saúde a tantos enfermos, durante vossa vida terrena. Perdoai meus pecados e serei curada!”
Vendo passar o Santíssimo Sacramento, ela começou a avançar de rastos, como podia, e não cessava de gritar: “Jesus Cristo, curai-me!”
— Coitada, é uma louca — comentavam alguns.
— Está embriagada... — sentenciavam outros
De uma ou outra maneira, todos os circunstantes mostravam-se escandalizados por esse espetáculo de uma mulher arrastando-se assim por terra e gritando sem parar. E a pressionavam para que se retirasse.
Mas nada foi capaz de detê-la: “Deixai-me livre de seguir meu Deus!” — respondia aos que a interpelavam. E continuou a avançar, repetindo aos brados sua súplica: “Senhor, perdoai meus pecados, e serei curada!”
Quem era a heróica protagonista dessa dramática cena que nos faz recordar vivamente diversos episódios dos Santos Evangelhos?
Fé recompensada
Era uma mulher cuja fé foi posta à prova de forma admirável e recompensada com um maravilhoso prodígio que comove e serve de exemplo para todos quantos dele tomam conhecimento.
Chamava-se Ana, tinha 45 anos, era esposa do mestre-marceneiro Delafosse, senhora de vida exemplar e piedade edificante. Há duas décadas, sofria de uma hemorragia que foi se agravando a ponto de os médicos julgarem tão inútil quanto perigoso prosseguir o tratamento.
Nos últimos meses, seu esgotamento não lhe permitia mais caminhar nem sequer de muletas. As dores tornavam-lhe insuportável a permanência no leito, e precisava ser carregada para sentar-se numa poltrona. Esse seu lamentável estado era público e notório no “Faubourg Saint-Antoine” e em vários outros bairros de Paris.
Reduzida a esse extremo, ela tomou a resolução de recorrer diretamente a Nosso Senhor Jesus Cristo no dia em que a procissão do Santíssimo Sacramento passaria diante de sua casa. Chegada a hora, pediu para ser levada até a porta. Lá permaneceu à espera, sustentada por duas caridosas amigas.
Quando uma delas lhe disse: “Está chegando o Santíssimo Sacramento”, ela soltou-se de seus braços e tentou ajoelhar-se sozinha. Aí deu-se o comovente episódio narrado acima.
Persistência recompensada
Longe de se deixar abater pelos que a pressionavam para sair da procissão, Ana Delafosse sentiu-se de repente fortalecida e conseguiu pôr-se de pé. Então, gritou com voz mais forte ainda: “Senhor, concedei-me a graça de entrar na vossa igreja, e serei curada!” Isto dito, pediu àquelas que a amparavam para soltá-la, pois queria caminhar sozinha.
Estupefação geral! Todos a viram andar no meio da multidão. Sem socorro de ninguém, mas perdendo uma grande quantidade de sangue, ela continuou caminhando até a igreja paroquial de Santa Margarida, ponto terminal da procissão.
Diante da porta da igreja, Ana Delaffose intensificou suas preces: “Senhor! Não permitais que eu entre no lugar santo sem estar plenamente curada!”
Os circunstantes observavam com crescente respeito e admiração essa mulher tão sofredora, tão confiante e ousada em suas súplicas.
No exato momento em que transpôs o umbral do templo sagrado, ela sentiu secar-se a fonte da hemorragia. Sem ajuda de pessoa alguma — ora de pé, ora de joelhos — assistiu à longa Missa solene durante cerca de duas horas. Depois se aproximou do sacrário e ficou rezando mais algum tempo diante de Jesus Sacramentado.
Quando, por fim, retornou à sua casa — caminhando com toda normalidade, sem qualquer auxílio — foi acompanhada de uma grande multidão, que louvava a Deus por ter dado aos pobres mortais uma tão eloqüente prova de seu poder e de sua bondade.
Lá chegando, a feliz Ana não pôde conter um sorriso ao ver que estavam à porta alguns parentes, com uma poltrona, prontos a carregá-la para sua cama de enferma incurável... Não tendo presenciado o milagre, não conseguiam esconder seu espanto ao verem-na subir a escada e caminhar pela casa como se nunca houvesse estado doente.
Testemunhas insuspeitas
A notícia do prodígio espalhou-se por toda a cidade. Um dos primeiros a dele tomar conhecimento foi o Dr. Prouhet, cirurgião que dela havia tratado durante quinze anos seguidos. “Não acredito, a menos que eu mesmo a veja caminhando”, afirmou. E foi no mesmo dia verificar com seus próprios olhos. Vendo-o entrar na casa, sua ex-cliente levantou-se e foi ao seu encontro, dizendo:
— Meu caro Doutor, um médico muito mais poderoso do que vós acaba de me curar!
Dois ilustres contemporâneos deixaram registrados seus insuspeitos depoimentos.
O advogado Barbier anotou em suas memórias: “Tivemos em Paris, na procissão de Corpus Christi, um milagre tão autêntico que até eu vejo-me obrigado a nele crer, o que não é pouca coisa” (Diário de Barbier, tomo I, p. 119).
E o ímpio Voltaire, tendo testemunhado o fato, depôs favoravelmente na investigação promovida pela autoridade eclesiástica. Escreve ele, numa carta a Madame de Bernières: “O milagre do ‘Faubourg Saint-Antoine’ deu-me um pequeno verniz de devoção. Fui citado no decreto. Fui convidado para o Te Deum cantado em ação de graças pela cura da Sra. Delafosse”.
Fachada da Igreja de Santa Margarida, em Paris, onde Ana Delafosse foi miraculosamente curada |
Pronunciamento da autoridade eclesiástica
Tomando conhecimento do extraordinário acontecimento, o Arcebispo de Paris, Cardeal Noailles, promoveu logo um inquérito. As informações e depoimentos de sessenta testemunhas conduziram à constatação da inegável veracidade do fato: a Sra. Delafosse, sofrendo de uma moléstia que se agravava a cada dia, de tratamento já não só inútil mas até mesmo perigoso, ficou num instante inteiramente curada, a ponto de parecer ter gozado sempre de perfeita saúde.
Não havendo, pois, como pôr em dúvida esses fatos, o Cardeal-Arcebispo Noailles emitiu um decreto de reconhecimento do milagre. E determinou que todos os anos, no domingo da oitava da festa de Corpus Christi, se realizasse uma comemoração litúrgica na Igreja de Santa Margarida.
Emocionado, o experiente cirurgião não mais duvidou do milagre, após ver a mulher descer com ele a escada e acompanhá-lo até a porta de saída, movimentando-se com a agilidade de uma jovem saudável.
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