quinta-feira, 3 de maio de 2012

SÚPLICA OUSADA, PORTENTOSA RECOMPENSA


Capela Sagrado Coração de Jesus - Paróquia Nossa Senhora das Graças

Por ter muita fé, confiança e persistência, uma devota da Eucaristia obteve o que pedia. Exemplo para todos quantos querem ser ajudados. Haverá quem não o queira?

Paris, 31 de maio de 1725. Pelas ruas engalanadas do “Faubourg Saint-Antoine”, seguia majestosa a procissão do Santíssimo Sacramento.
A certa altura, um acontecimento inesperado quebrou a solenidade do augusto evento. Na porta de uma casa, uma mulher visivelmente extenuada por alguma enfermidade desvencilhou-se das amigas que a sustentavam de pé e tentou ajoelhar-se diante do Deus Sacramentado que passava.
O resultado foi desastroso: caindo ao chão, viu-se ela reduzida à humilhante situação de ficar apoiando-se nos joelhos e nas mãos.
Indiferente a tudo, porém, fixando a branca Hóstia consagrada, ela suplicava em alta voz: “Senhor! Se quiserdes, podeis curar-me!” Algumas pessoas compassivas fizeram menção de ajudá-la, mas ela, sem lhes dar atenção, insistia: “Senhor, sois o mesmo Jesus que restituiu a saúde a tantos enfermos, durante vossa vida terrena. Perdoai meus pecados e serei curada!”
Vendo passar o Santíssimo Sacramento, ela começou a avançar de rastos, como podia, e não cessava de gritar: “Jesus Cristo, curai-me!”
— Coitada, é uma louca — comentavam alguns.
— Está embriagada... — sentenciavam outros
De uma ou outra maneira, todos os circunstantes mostravam-se escandalizados por esse espetáculo de uma mulher arrastando-se assim por terra e gritando sem parar. E a pressionavam para que se retirasse.
Mas nada foi capaz de detê-la: “Deixai-me livre de seguir meu Deus!” — respondia aos que a interpelavam. E continuou a avançar, repetindo aos brados sua súplica: “Senhor, perdoai meus pecados, e serei curada!”
Quem era a heróica protagonista dessa dramática cena que nos faz recordar vivamente diversos episódios dos Santos Evangelhos?
Fé recompensada
Era uma mulher cuja fé foi posta à prova de forma admirável e recompensada com um maravilhoso prodígio que comove e serve de exemplo para todos quantos dele tomam conhecimento.
Chamava-se Ana, tinha 45 anos, era esposa do mestre-marceneiro Delafosse, senhora de vida exemplar e piedade edificante. Há duas décadas, sofria de uma hemorragia que foi se agravando a ponto de os médicos julgarem tão inútil quanto perigoso prosseguir o tratamento.
Nos últimos meses, seu esgotamento não lhe permitia mais caminhar nem sequer de muletas. As dores tornavam-lhe insuportável a permanência no leito, e precisava ser carregada para sentar-se numa poltrona. Esse seu lamentável estado era público e notório no “Faubourg Saint-Antoine” e em vários outros bairros de Paris.
Reduzida a esse extremo, ela tomou a resolução de recorrer diretamente a Nosso Senhor Jesus Cristo no dia em que a procissão do Santíssimo Sacramento passaria diante de sua casa. Chegada a hora, pediu para ser levada até a porta. Lá permaneceu à espera, sustentada por duas caridosas amigas.
Quando uma delas lhe disse: “Está chegando o Santíssimo Sacramento”, ela soltou-se de seus braços e tentou ajoelhar-se sozinha. Aí deu-se o comovente episódio narrado acima.
Persistência recompensada
Longe de se deixar abater pelos que a pressionavam para sair da procissão, Ana Delafosse sentiu-se de repente fortalecida e conseguiu pôr-se de pé. Então, gritou com voz mais forte ainda: “Senhor, concedei-me a graça de entrar na vossa igreja, e serei curada!” Isto dito, pediu àquelas que a amparavam para soltá-la, pois queria caminhar sozinha.
Estupefação geral! Todos a viram andar no meio da multidão. Sem socorro de ninguém, mas perdendo uma grande quantidade de sangue, ela continuou caminhando até a igreja paroquial de Santa Margarida, ponto terminal da procissão.
Diante da porta da igreja, Ana Delaffose intensificou suas preces: “Senhor! Não permitais que eu entre no lugar santo sem estar plenamente curada!”
Os circunstantes observavam com crescente respeito e admiração essa mulher tão sofredora, tão confiante e ousada em suas súplicas.
No exato momento em que transpôs o umbral do templo sagrado, ela sentiu secar-se a fonte da hemorragia. Sem ajuda de pessoa alguma — ora de pé, ora de joelhos — assistiu à longa Missa solene durante cerca de duas horas. Depois se aproximou do sacrário e ficou rezando mais algum tempo diante de Jesus Sacramentado.
Quando, por fim, retornou à sua casa — caminhando com toda normalidade, sem qualquer auxílio — foi acompanhada de uma grande multidão, que louvava a Deus por ter dado aos pobres mortais uma tão eloqüente prova de seu poder e de sua bondade.
Lá chegando, a feliz Ana não pôde conter um sorriso ao ver que estavam à porta alguns parentes, com uma poltrona, prontos a carregá-la para sua cama de enferma incurável... Não tendo presenciado o milagre, não conseguiam esconder seu espanto ao verem-na subir a escada e caminhar pela casa como se nunca houvesse estado doente.
Testemunhas insuspeitas
A notícia do prodígio espalhou-se por toda a cidade. Um dos primeiros a dele tomar conhecimento foi o Dr. Prouhet, cirurgião que dela havia tratado durante quinze anos seguidos. “Não acredito, a menos que eu mesmo a veja caminhando”, afirmou. E foi no mesmo dia verificar com seus próprios olhos. Vendo-o entrar na casa, sua ex-cliente levantou-se e foi ao seu encontro, dizendo:
— Meu caro Doutor, um médico muito mais poderoso do que vós acaba de me curar!
Dois ilustres contemporâneos deixaram registrados seus insuspeitos depoimentos.
O advogado Barbier anotou em suas memórias: “Tivemos em Paris, na procissão de Corpus Christi, um milagre tão autêntico que até eu vejo-me obrigado a nele crer, o que não é pouca coisa” (Diário de Barbier, tomo I, p. 119).
E o ímpio Voltaire, tendo testemunhado o fato, depôs favoravelmente na investigação promovida pela autoridade eclesiástica. Escreve ele, numa carta a Madame de Bernières: “O milagre do ‘Faubourg Saint-Antoine’ deu-me um pequeno verniz de devoção. Fui citado no decreto. Fui convidado para o Te Deum cantado em ação de graças pela cura da Sra. Delafosse”.

Fachada da Igreja de Santa Margarida, em Paris, onde Ana Delafosse
foi miraculosamente curada

Pronunciamento da autoridade eclesiástica
Tomando conhecimento do extraordinário acontecimento, o Arcebispo de Paris, Cardeal Noailles, promoveu logo um inquérito. As informações e depoimentos de sessenta testemunhas conduziram à constatação da inegável veracidade do fato: a Sra. Delafosse, sofrendo de uma moléstia que se agravava a cada dia, de tratamento já não só inútil mas até mesmo perigoso, ficou num instante inteiramente curada, a ponto de parecer ter gozado sempre de perfeita saúde.
Não havendo, pois, como pôr em dúvida esses fatos, o Cardeal-Arcebispo Noailles emitiu um decreto de reconhecimento do milagre. E determinou que todos os anos, no domingo da oitava da festa de Corpus Christi, se realizasse uma comemoração litúrgica na Igreja de Santa Margarida.
Emocionado, o experiente cirurgião não mais duvidou do milagre, após ver a mulher descer com ele a escada e acompanhá-lo até a porta de saída, movimentando-se com a agilidade de uma jovem saudável.

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