quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Batismo - Capela Nossa Senhora de Fátima

Em verdade, em verdade eu vos digo, quem não renascer da água e do Espírito Santo não entrará no reino de Deus” ( Jo 3,5)
Toda a vida adquire sua origem num nascimento.  É o que realiza em nós o santo batismo. Ele nos faz entrar em uma vida superior, faz de nós membros vivos do Corpo Místico de Cristo.
O batismo é conferido às crianças dos pais que pedem por elas; a elas, em seguida, cabe ratificar o que foi feito.

As graças são tão sensíveis que um jovem após receber os sacramentos do batismo e da Primeira Comunhão declarou: “Na hora do Batismo, senti como se tivesse tomado um banho. Mas o que eu mais gostei foi de comungar! Pedi muitas coisas a Nosso Senhor: pedi para ir para o Céu, e também meu pai, minha mãe e minha irmã. Também queria pedir para ver o Paraíso, mas não deu tempo...”

segunda-feira, 10 de junho de 2013

O conde mau e os dois amigos

Esta história teve lugar há mais de dezesseis séculos. Eram dias de grande festa em todas as cidades e aldeias da antiga Armênia, e havia razão de sobra para tantas músicas e comemorações: o imperador Tiridates havia se convertido ao Cristianismo.
A maior parte da população do país já era de fato cristã, e a notícia trouxe júbilo a todos. A todos? Não... Na verdade, houve também os que não a receberam com tanta alegria.
Um desses era o nobre Kammo. É difícil traduzir os títulos orientais da época, mas ele seria mais ou menos o que hoje chamamos um conde. Por facilidade de expressão, vamos nos referir a ele como o conde Kammo. Sua autoridade estendia-se numa pequena região situada às margens do lago Servan, onde ele possuía um bem guarnecido castelo construído sobre uma colina.
Pagão e seguidor de Zoroastro desde a infância, o conde Kammo recebeu de mau-grado a notícia. Não ousou enfrentar a autoridade imperial, mas em seu íntimo concebeu a intenção de dificultar ao máximo a vida dos cristãos. Após alguns dias, escolheu seu alvo: um honrado comerciante da cidade, chamado Vardenis, cristão fervoroso e braço direito do pároco local. O malvado conde conseguiu falsas testemunhas para o acusarem de um crime que não cometera, e assim, o pobre homem foi levado a julgamento.
Como ao próprio conde cabia o exercício da justiça naquela parte do reino, foi rápido e fácil condenar Vardenis. Numa triste tarde de outono, no salão do castelo, desolado ele ouviu sua condenação à morte. No entanto, ousou fazer um último pedido ao juiz iníquo.
— Por favor, ó conde, faço-vos um derradeiro pedido: visitar pela última vez, antes de ser executado, meus velhos pais que vivem na distante aldeia de Tumanyan.
O conde irritou-se, pois julgou tratar-se de mera artimanha. Quem poderia garantir que o condenado não aproveitaria a ocasião para fugir do país e nunca mais voltar? No entanto, este assegurou:
— Podeis acreditar em mim, ó conde. Ao viajar, deixarei em meu lugar um refém, como garantia de minha volta. Bem sabeis que não tenho parentes próximos aqui, mas tenho um grande amigo chamado Talin e estou certo de que, por amor a Deus, ele consentirá em fazer-me este supremo favor.
O mau conde riu, pois não acreditava existir alguém néscio a ponto de colocar-se voluntariamente em tal situação de perigo. Porém, no intuito de provar a ingenuidade de um cristão, autorizou que, sob forte guarda armada, Vardenis fosse ter com seu amigo. Qual não foi sua surpresa quando, horas depois, retornava ao castelo o infeliz condenado, em companhia de seu fiel amigo Talin.
Contrariado, o conde mostrou-se inclemente:
— Oh! percebo que há entre os cristãos gente suficientemente tola para se expor a isso. Pois bem, podes partir, mas se dentro de sete dias não te apresentares de volta até o pôr-do-sol, saibas: a cabeça de teu amigo Talin irá rolar!
Com um grande abraço, despediram-se os amigos, e Vardenis partiu a cavalo rumo à distante Tumanyan. Acorrentado em um úmido calabouço, Talin ficou esperando passarem-se os dias e as horas.
Na verdade, o conde Kammo tinha razões maquiavélicas para autorizar o sentenciado a empreender essa viagem. Ele estava seguro de que Vardenis não voltaria. Talin seria fatalmente executado em seu lugar, e isso só poderia causar desprestígio aos cristãos, provando que, por mais que em suas igrejas se pregasse o amor ao próximo, na hora do perigo um cristão fugia para salvar sua própria pele, como faria qualquer pagão. E tratando-se de um personagem tão conhecido, amigo pessoal e homem de confiança do pároco, o escândalo seria ainda maior! O conde esfregava as mãos com maligna alegria, enquanto aguardava o fatídico dia da execução.
Passaram-se os dias e a notícia se espalhou por toda aquela região da Armênia. Vardenis voltaria ou não? Chegou por fim o temido sétimo dia, e o sol declinava perigosamente no horizonte. O infeliz Talin já fora conduzido ao pátio das execuções, com as mãos amarradas às costas. O sinistro carrasco esperava em um canto, munido de seu enorme machado. E o conde, satisfeito, a tudo assistia de uma poltrona posta em local privilegiado.
Justamente quando o sol estava a ponto de esconder-se atrás das montanhas, ouvem-se gritos, um grande vozerio e um tropel de cavalo do lado de fora do castelo. Era Vardenis que retornava!
Empoeirado e ofegante, ele entra correndo no grande pátio. Ao vê-lo, Talin protesta:
— Por que voltaste, ó insensato? Eu já tinha oferecido minha vida pela tua! Bem sabes que o fiz de coração, e dava meu sacrifício por bem pago!
— Nunca, meu amigo! A ti, que és meu irmão na fé e a quem tanto estimo, jamais abandonaria a uma tão desgraçada sorte!
Continuavam ainda a discutir quando, de súbito, um brado os interrompeu. Era a forte voz de Kammo, que com firmeza dizia:
— Basta! Há dias atrás, emiti uma sentença de morte. Agora, diante do que vejo, devo pronunciar mais uma!
Fez-se um grande silêncio e todos, espantados, tinham os olhos cravados na enigmática figura do poderoso conde. E ele continuou:
— Hoje, decreto pena de morte à... à dureza de meu coração! Em toda a minha vida, nunca ousei imaginar que pudesse haver tão sincera amizade! Assim, perdôo aos dois, com a condição de que — dom magnífico! — me aceitem como partícipe dessa maravilhosa amizade!
Os amigos entreolharam-se, e Talin tomou a palavra:
— Nobre conde, entendo o que sentis. No entanto, previno-vos de que nossa amizade é fruto do Batismo, o qual nos mune do celeste auxílio para chegarmos a tão alto grau de dedicação ao próximo. Se, pois, quereis realmente participar desta autêntica amizade, fazei-vos batizar, e sendo cristão, sabereis o que é ter verdadeiros amigos!
E assim sucedeu. Convertido pelo magnífico exemplo dos dois amigos, dias depois o conde Kammo fez-se cristão em pública e concorridíssima cerimônia. Desta maneira ele, de cruel tirano, tornou-se um dos mais benéficos e justos nobres que a Armênia jamais teve…




quarta-feira, 22 de maio de 2013

Orquídeas e santos


A indescritível diversidade existente entre as orquídeas aponta para outra maior: a dos santos. Há no Jardim Celestial uma variedade superior à das flores terrenas.
Elegantemente suspensas no tronco de frondosas árvores, exalando perfume, beleza e suavidade, desabrocham, sobretudo, nas selvas tropicais umas das mais belas flores que o homem possa contemplar: as orquídeas.
Embora a maioria delas nasça nas florestas quentes, seu mais propício hábitat natural, outras brotam em prados secos ou úmidos, em relvados, mangais, matas temperadas, dunas, rochas e até no subsolo. Pois esta família botânica de surpreendente variedade compõe-se de dezenas de milhares de espécies oriundas de todas as latitudes do planeta: do círculo polar ártico ao mais tórrido clima equatorial.
Muitas destacam-se por suas exóticas formas e combinações de cores; outras apresentam um aspecto mais sóbrio, sem serem, entretanto, menos belas. Também existem aquelas de aparência jocosa, como a Orchis símia, uma espécie europeia que evoca a forma de macaco. Algumas têm um colorido “selvagem” que faz lembrar a pele de um tigre ou um leopardo. Já as do gênero Oncidium são conhecidas como “chuva de ouro”, devido ao seu pequeno tamanho, vistosa cor amarelo vivo e exuberante inflorescência.
Contudo, a maioria das orquídeas se caracteriza por uma beleza suave e harmônica. Assim são as do gênero Barkeria, originárias do México, de delicados tons rosados ou lilás, e as Catleias, verdadeiras rainhas desta família botânica, cuja deslumbrante formosura os cultivadores procuram incessantemente requintar. No mundo das orquidáceas, como no das flores em geral, o charme se encontra na variedade de formas, cores e perfumes. Se todas elas fossem iguais, perderiam muito de seu esplendor.
* * *
A indescritível diversidade existente entre as flores aponta para outra ainda maior: a das almas. Embora todos os homens gozem de igual dignidade — enquanto seres criados à imagem de Deus, dotados de alma racional e redimidos pelo Sangue preciosíssimo de Cristo —, cada um difere dos demais, por refletir um aspecto original e único das infinitas perfeições do Criador.
E assim como acontece com as orquídeas, há santos de todos os feitios, temperamentos, carismas. Junto a São Filipe Neri, simpático e até jocoso, deparamo-nos com o ascético Santo Antão; veneramos tanto São Luís, Rei de França, ou Santa Isabel, Rainha de Portugal, quanto o Poverello de Assis ou Santa Zita, empregada doméstica.
Nada tão desigual e ao mesmo tempo tão semelhante quanto dois santos. Nada mais harmônico que o grande Jardim Celestial onde brilham as feéricas cores das boas obras, e do qual emana o perfume inebriante das virtudes dos bem-aventurados. Há ali uma variedade superior à da família das orquídeas, pois o universo das almas é mais rico em diversidades e belezas do que qualquer outro conjunto da terra. 

terça-feira, 7 de maio de 2013

Histórias para catequese

Na cozinha, com Irmão Bartolomeu


No fim da tarde, o mestre em doutrina se apresentou na cozinha, para ajudar o frei cozinheiro. Justo naquela noite, o prato da ceia seria talharim com molho ragu.
Situado no último andar da mais alta torre do mosteiro, o quarto do abade Luigi ocupava um lugar estratégico. A escolha do aposento não fora sem motivo, pois o prudente superior fazia questão de ter uma boa visão do mosteiro entregue pela Providência aos seus cuidados.
Naquela manhã, ao olhar pelas janelas, dois monges lhe chamaram a atenção. O primeiro foi Irmão Bartolomeu, o qual, subindo a trilha, voltava da cidade arfando sob o peso de duas grandes sacolas repletas de víveres por ele recebidos na feira da cidade.
Esse bom frade era homem simples, de pouca instrução, mas muito piedoso e dedicado. Conseguia os mantimentos e ele mesmo os preparava, procurando, até onde permitia a pobreza franciscana, servir aos monges a melhor alimentação possível.
Da outra janela, o abade avistava o claustro. Sentado em um banco de pedra, estava o segundo monge alvo de suas atenções. Tendo alguns livros empilhados à sua volta, Frei Lucrécio lia entusiasmado um grosso volume de apologética. Era ele quem ministrava as aulas aos jovens noviços, e sua segurança em matéria doutrinária lhe granjeara fama nas redondezas, a tal ponto que tanto leigos como religiosos vinham consultá-lo sobre intrincados pontos dos ensinamentos cristãos.
Observando os dois monges, o velho abade pôs-se a meditar na grandeza de Deus, que criava homens tão diferentes, mas os fazia viver sob o mesmo teto, irmanados pela mesma vocação, e chamados a servir a seus semelhantes de maneiras diversas.
* * *
No meio daquela tarde, alguém subiu os degraus da torre e bateu à porta do quarto do abade. Era Frei Lucrécio. Com um livro debaixo do braço, pedia uma conversa reservada com seu superior.
— Pois não, irmão. Alguma dificuldade o aflige?
— Não a mim, senhor abade, mas à nossa comunidade. Desculpe-me, mas não posso mais suportar o fato de haver entre nós uma pessoa tão desqualificada como esse... esse Irmão Bartolomeu!
O abade Luigi levantou as sobrancelhas, um pouco surpreso. Que mal teria feito o humilde monge? E Frei Lucrécio continuou, dando argumentos para demonstrar como aquele homem tão ignorante causava malefício à comunidade:
— Ele simplifica tudo! Nunca consegue acompanhar os elevados raciocínios que eu, mestre em teologia, procuro transmitir. Ademais, tem costumes estranhos, como, por exemplo, na ocasião em que tentou ensinar um papagaio a rezar a Ave Maria...
O abade ouviu, com ar perplexo e sem dizer palavra, o monge apresentar suas queixas. Seu olhar atento indicava estar ele pensando rápido, porém profundamente. E quando o outro terminou de falar, respondeu:
— Pois bem. Tudo quanto você me disse é muito sério. Mas eu gostaria de ter mais dados, antes de tomar alguma atitude. Por exemplo, não sei exatamente o que ele faz na cozinha, quando fica sozinho. Assim, peço acompanhá-lo esta tarde na preparação do jantar, e depois me apresentar um relato detalhado de tudo o que ele diz e faz. Fique atento a qualquer atitude na qual ele demonstre essa suposta mediocridade, ou ignorância, por você mencionada. Em função disso, tomaremos uma atitude.
* * *

E assim foi. No fim da tarde, o mestre de teologia se apresentou na cozinha, para ajudar o irmão cozinheiro. Como este nunca discutia uma ordem superior, nada perguntou a respeito. Justo naquela noite, o prato da ceia seria talharim com molho ragu. O douto monge observava com atenção tudo quanto o outro fazia. Além da carne moída, havia vários ingredientes que lhe pareciam bem saborosos, como, por exemplo, cebola, toucinho e tomate, este último por ele especialmente apreciado. Quando, porém, Frei Bartolomeu começou a cortar as cenouras, Frei Lucrécio protestou:
— Como? A tantas delícias, você vai acrescentar essas míseras cenouras? Esse vegetal mesquinho vai alterar completamente o gosto do molho!
— Mas... mas... eu sempre fiz assim! — disse o pobre cozinheiro.
— Pois bem, se quiser, sirva isso para os outros. Para mim, separe uma parte do molho, sem essas pérfidas cenouras.
Enquanto isso, Frei Lucrécio pensava consigo mesmo: “Aqui está, sem dúvida, uma prova da ignorância desse homem, pois em tudo o que ele faz procura acrescentar uma nota de mau gosto, como essa história das cenouras. Amanhã, vou contar isso ao abade”.
Na hora do jantar, todos comeram a pasta com o ragu convencional, exceto Frei Lucrécio, a quem foi servida a parte sem cenouras. Para sua surpresa, o preparado estava horrivelmente ácido, a tal ponto que ele com dificuldade pôde terminar o prato. Como, porém, havia sido uma exigência sua, ele tudo comeu sem nada reclamar...
* * *
Aquela não foi uma boa noite. O molho definitivamente não lhe caiu bem. Ele não conseguiu dormir direito, teve pesadelos e acordou várias vezes com enjôo. Na manhã seguinte, pálido e com olheiras, foi falar com o abade para apresentar seu relato. Este se impressionou com o aspecto doentio do douto mestre, o qual então lhe contou o ocorrido com o molho ácido, causa de seu mal-estar.
O experiente abade, sorrindo, lhe disse:
— Sabe, Irmão Lucrécio, quando fui noviço, trabalhei um bom tempo na cozinha. Aliás, fui eu que pedi a Frei Bartolomeu para fazer ragu ontem. É bem interessante como a culinária, em certas ocasiões, apresenta exemplos úteis à vida religiosa. Na verdade, compor uma boa comunidade muitas vezes é como preparar uma boa receita: exige a sábia combinação de vários ingredientes. Veja o tomate: tem um sabor todo especial e é um dos elementos centrais do molho, mas facilmente se torna ácido; por isso é necessário colocar junto dele a humilde cenoura, cuja função nessa receita não é dar sabor, mas justamente absorver a acidez do conjunto.
Irmão Lucrécio, acredito que esteja compreendendo bem esta comparação, mas quero deixá-la mais clara. Assim como o cozinheiro na preparação da receita, também eu, na função de abade, devo cuidar de monges que me são preciosos por sua sabedoria e doutrina, embora sejam por vezes “ácidos”. E para isso, me ajuda dispor também de outros que não têm muita proeminência, mas, por sua simplicidade, agem como as cenouras no molho ragu: suavizam o conjunto. Entende agora, irmão, porque me alegra poder ter você e Frei Bartolomeu juntos em nossa comunidade?
Frei Lucrécio aceitou com humildade as palavras de seu virtuoso abade. Reconfortado, agradeceu o ensinamento e, após a benção, se dispôs a sair. Quando estava já à porta, ele ainda lhe disse:
— Ah, um detalhe a mais, irmão: o molho ficou ácido também por não ter cozido durante o tempo suficiente; na culinária como na vida cristã, a paciência é uma virtude fundamental para que tanto o alimento quanto o convívio tenham sabor suave e agradável... 

segunda-feira, 29 de abril de 2013

O Altar, símbolo de Cristo



No início do Cristianismo, o altar era de madeira, tendo a forma das mesas usadas nas refeições, pois a Eucaristia era celebrada nas casas particulares. O altar de pedra generalizou-se, sobretudo no Ocidente, devido ao costume de celebrar as festas dos mártires sobre a pedra do seu sepulcro. Com a paz de Constantino e, mais especialmente, sob o pontificado do Papa Dâmaso (366-384) foram construídas, tanto em Roma como noutras cidades, basílicas e igrejas em honra dos mártires mais ilustres, sendo os altares erigidos sobre seus túmulos. O Liber Pontificalis atribui ao Papa Félix (269-274) um decreto no qual se ordena celebrar a Missa sobre os túmulos dos mártires (Constituit supra memorias martyrum missas celebrare, Lib. Pont., ed. Duchesne, I, 158).
Com o correr dos séculos, a simbologia do altar ficou associada também ao fato de ser de pedra, como se pode ver pela interpretação dada pelo Doutor Angélico, na Suma Teológica: Isso convém ao significado da Eucaristia, seja porque o altar simboliza a Cristo, como diz Paulo: “este rochedo era o Cristo”(Cor 14,4), seja também porque o corpo de Cristo foi sepultado num sepulcro de pedra. Além disso, convém ao uso do Sacramento, uma vez que a pedra é sólida e pode ser encontrada em qualquer parte (S.T. III, q. 83. a. 3, ad 5).
Esse antiquíssimo costume de celebrar a Missa sobre os túmulos dos mártires está na origem da recomendação da Igreja de colocar sob a pedra do altar relíquias de mártires ou de santos.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

As Cinco Chagas do Senhor

O primeiro ato de adoração às Santas Chagas foi realizado por Maria Santíssima, quando desceram Jesus da Cruz. De São Tomé até nossos dias, muitos foram os devotos e propagadores desta belíssima devoção.
Jesus é descido da Cruz. Cuidadosamente, Nicodemos, José de Arimatéia e São João O conduzem até Maria Santíssima e O depositam em seu virginalíssimo regaço. Sentada, Ela O acolhe transida de dor e O adora. Enquanto as Santas Mulheres preparam os bálsamos com que em breve irão ungi-Lo, para ser depositado no sepulcro, Ela oscula, uma a uma, suas Chagas: a do peito rasgado, as dos divinos pés e mãos. Realiza-se ali o primeiro ato de devoção e adoração às Chagas do Redentor, que iria perpetuar-se por todas as gerações. A Bem-Aventurada por excelência rende o mais perfeito culto de latria às fontes sagradas de onde jorrou o Sangue que redimiu total e superabundantemente todo o gênero humano.
Por causa daquelas Santíssimas Chagas, Ela fora preservada do pecado original e aos homens de boa vontade abriram-se as portas do Céu. Cinco fontes de graças infinitas, plenas de formosura, saciando a santidade das almas contemplativas, missionárias e apostólicas, selando a coroa de glória dos mártires e as vitórias de todos os tempos. Eis o manancial que nos purifica no Batismo, nos revivifica na Eucaristia e dá fecundidade a toda a Santa Igreja, nos seus sacramentos. Eis a santa argamassa que, ligada aos sacrifícios dos homens, erguerá os mais belos monumentos e poemas da Civilização Cristã.
                                                                 * * *
 “Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos. Aproxima a tua mão e mete-a no meu lado”. Poucos dias após a ressurreição, é o próprio Redentor que convida o incrédulo Tomé a ter devoção às suas Santas Chagas. Já deslumbrado, ele respondeu-Lhe: “Meu Senhor e meu Deus!” As tíbias almas que dificilmente se deixam convencer, a progênie dos cépticos, a própria incredulidade, quase se diria, sucumbiram no instante mesmo em que aquele feliz e invejado Apóstolo introduziu seu dedo no lado de Jesus.
São Francisco de Assis, Santa Gemma Galgani, São Pio de Pietrelcina — enfim, uma legião de santos e almas virtuosas — foram galardoados com os estigmas da Paixão de Cristo. É um modo maravilhoso de Ele condecorar alguns daqueles a quem mais ama, na face da terra. É seu invisível e puro amor tornado visível em seus prediletos, para perpetuar na memória dos homens a bem-aventurança daqueles que acreditam sem terem visto e tocado as Chagas do Senhor, como Tomé.
A devoção às Santas Chagas não é privilégio apenas de algumas almas, mas o é também de nações. Em Portugal, por exemplo, ela é muito antiga e marcou profundamente a piedade dos fiéis, quase desde os alvores da nacionalidade.
Camões, em seu imortal poema, “Os Lusíadas”, na dedicatória ao rei Dom Sebastião, registra em versos essa antiga e piedosa tradição, gravada também na bandeira nacional e no escudo heráldico da Casa Real: 
Vede-o no vosso escudo, que presente
Vos amostra a vitória já passada,
Na qual vos deu por armas e deixou
As que Ele para si na Cruz tomou.

A devoção às Chagas de Jesus Cristo, sinais amorosos de seu martírio e, posteriormente, de sua glorificação, aperfeiçoam em nós a gratidão, que leva a pagar amor com amor, até o holocausto total, por Deus e pelos irmãos. 


Hino às Santas Chagas do Senhor

Cinco fontes de graças infinitas,
Ó Chagas, cheias de alta formosura,
Aceitai a tensão humilde e pura
Das palavras que digo e tenho ditas.

E quantas na minha alma têm escritas
Mil culpas feias, com mão feia e dura,
Curai com vossa graça e com brandura,

Ó Chagas d’meu Senhor, Chagas benditas.
No sacro Sangue que de Vós correu
Se cure; e lave e gaste e purifique
As nódoas que com dor nelas estou vendo.

Por vós, que belas sois, formosa fique,
Por vós resplandecente entre no Céu,
Onde vos veja estar resplandecendo.

(Liturgia das Horas, festa das Cinco Chagas: Hino do Ofício das Leituras)





quarta-feira, 20 de março de 2013

Catequese Capela Nossa Senhora de Fátima


A começar pela assistência religiosa dispensada à população local por meio de Missas dominicais e distribuição dos Sacramentos; cresce o serviço de catequese, preparação e celebração do Sacramento do Matrimônio, formação litúrgica para coroinhas e iniciativas de auxílio aos núcleos mais carentes da região.

As irmãs dos Arautos do Evangelho desenvolvem uma catequese na Capela Nossa Senhora de Fátima da Paróquia Nossa Senhora das Graças na qual os jovens e pais participam de uma encenação teatral.








domingo, 24 de fevereiro de 2013

Paróquia Nossa Senhora das Graças

“Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes”.( Mt 25,40)

Em uma tarde como as outras e os moradores de Caieiras desempenhavam suas funções rotineiras quando, de repente, ouviram um ruído de carro e alguém os chamar.

Eram as irmãs da Sociedade de Vida Apostólica Regina Virginum ( ramo feminino dos Arautos do Evangelho) que levando uma consoladora mensagem de confiança em Nossa Senhora, distribuíam medalhas, livros e presentes aos fiéis da Paróquia Nossa Senhora das Graças











terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Retiro das Martinhas




Nos dias 11 e 12 de fevereiro de 2013, reuniram-se na Capela de Santa Inês, cerca de 50 Martinhas de diversas capelas da Paróquia Nossa Senhora das Graças.

Nesses dias, as jovens e crianças puderam aproveitar o feriado do Carnaval para juntas, num convívio repleto de amizade e animação, considerarem alguns pontos da Doutrina Católica, especialmente ao que diz respeito à finalidade da vida e a bem-aventurança eterna.

O Padre David Ritchie, EP, celebrou a Santa Missa, e no final entregou para cada participante um livro de orações.

Assista ao video com o resumo das atividades clicando na imagem ou link abaixo.




quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

O arco-íris: Sinal da Aliança divina

Após o Dilúvio, Deus quis selar com os homens uma aliança da qual o arco-íris é o símbolo. Passados muitos séculos, uma nova Aliança haveria de ser feita, mais bela e sublime que a primeira.
Certos fenômenos atmosféricos evocam de modo característico o Criador. Alguns, como o fragor do trovão ou a força da tempestade, nos lembram o Seu ilimitado poder; outros, como o nascer do Sol ou a suave bruma da manhã, nos remetem aos aspectos bondosos e protetores do Altíssimo.
Há, entretanto, uma manifestação da natureza toda especial, que o próprio Criador escolheu como símbolo de Sua aliança com os homens: o arco-íris.
Sobre este misterioso fenômeno, que flutua intangível na atmosfera como vitorioso combatente após a tempestade, diz o Gênesis: “E Deus disse: ‘Eis o sinal da aliança que Eu faço convosco e com todos os seres vivos que vos cercam, por todas as gerações futuras: Ponho o meu arco nas nuvens, para que ele seja o sinal da aliança entre Mim e a Terra. Quando Eu tiver coberto o céu de nuvens por cima da Terra, o meu arco aparecerá nas nuvens, e Me lembrarei da aliança que fiz convosco e com todo ser vivo de toda espécie’” (Gn 9, 12-15).
Com o advento da Nova Lei, este antigo símbolo do perdão de Deus passou a ser tomado por muitos autores sacros como uma prefigura de Nossa Senhora. Assim, São Bernardino de Sena comenta, a respeito da Virgem: “Ela é o arco-íris dado pelo Senhor a Noé em sinal de aliança, e como penhor de que o gênero humano não será mais destruído. E por quê? Porque é Ela quem trouxe à luz Aquele que é nossa paz, Aquele que de duas naturezas fez uma só Pessoa”.
Outro renomado estudioso, o padre Thiébaud, acrescenta: “Quando, depois de uma tempestade, percebemos o arco-íris baixando das nuvens sobre a Terra, não podemos impedir-nos de admirar esse belo manto, tecido com as sete cores primitivas, verdadeiro símbolo da misericórdia. Mas, o esplendor desse fenômeno logo se eclipsa em presença de Maria, na qual os sete dons do Espírito Santo refulgiram com tanta magnificência”.
E a própria Mãe de Deus revelou a Santa Brígida, em uma aparição: “Este arco-íris, sou Eu mesma que, por minhas preces, abaixo-Me e Me debruço sobre os bons e os maus habitantes da Terra. Inclino-Me sobre os bons para ajudá-los a permanecerem fiéis e devotos na observância dos preceitos da Igreja; e sobre os maus, para impedi-los de irem adiante na sua malícia e se tornarem piores”.
* * *
Assim, quando, após uma tarde chuvosa, o arco-íris vier encantar-nos a vista e o coração com suas cores ora suaves, ora vibrantes, lembremo-nos desta mensagem que o próprio Deus nos envia através de tão belo emissário: há uma sublime ponte entre o Céu e a Terra, uma promessa de maternal proteção: Maria Santíssima, Mãe de Deus e Mãe nossa.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

O homem que sabia o dia de sua morte

O jovem Conde Rodolfo, homem saudável e forte, de formosa aparência, destro no manejo das armas, exímio cavaleiro e hábil caçador, imaginava que jamais morreria ou que, pelo menos, isto só lhe aconteceria depois de muitos e muitos anos.
Numa fria tarde de outubro de 1321, embrenhou-se ele na densa floresta, perseguindo a presa que tentava escapar-lhe. Quando já começava a escurecer, avistou entre as árvores algo que lhe parecia uma parede. Cansado de cavalgar, desmontou, aproximou-se e viu que era uma antiga capela abandonada. Entrou. Tudo estava em ruínas: vitrais quebrados, bancos virados, poeira acumulada, morcegos, etc.
De qualquer forma, pensou, há paredes e teto, é melhor do que nada. Juntando alguns bancos, improvisou um leito e, exausto como estava, logo adormeceu.
Noite alta, acordou ouvindo um som de sinos. Extremamente surpreso, esfregava os olhos e não conseguia acreditar no que via: a pequena capela estava iluminada e repleta de fiéis. No altar, um sacerdote celebrava a Missa. Perto do presbitério, estava um caixão. Era, pois, uma Missa de corpo presente, concluiu ele.
— Desculpe-me, senhora, mas na intenção de quem está sendo celebrada esta Missa? — perguntou. —
Então Vossa Senhoria não sabe quem morreu? É um nobre cavaleiro da região de Zurique, que se perdeu nesta floresta durante uma caçada e foi encontrado morto hoje... dia 26 de outubro de 1371. O Conde Rodolfo estremeceu todo. Com um estranho pressentimento, quis saber quem era esse cavaleiro. Aproximou-se do caixão, levantou o véu que cobria o rosto do defunto e... sentiu um terrível calafrio. O morto era ele! Já estava envelhecido, é certo, mas não restava dúvida alguma de que era mesmo ele que estava naquele caixão.
Dando um grito de susto... acordou. Percebeu então que aquele terrível sonho era um aviso do Céu: morreria exatamente dali a 50 anos.
Saiu da igreja e retornou ao esplêndido castelo de sua família, onde se realizava uma magnífica festa. Em meio à alegria e aos divertimentos, pensou: “50 anos é muito tempo. Quer saber de uma coisa? Vou fazer uma divisão inteligente: nos primeiros 25 anos, gozarei a vida e nos 25 restantes me prepararei seriamente para a morte”.
Passou, assim, 25 anos de diversões, caçadas, festas, alegria contínua. Mas... escoaram-se muito rapidamente! Então, o Conde decidiu: “Ora, ora, 25 anos é tempo demais de preparação para a morte. Assim, os próximos 15 anos serão um prolongamento dos 25 que já se foram. Quando faltarem só 10, aí sim, me prepararei seriamente”.
E assim sucedeu... Foram mais 15 anos de prazeres, que transcorreram mais rapidamente que os 25 anteriores. A cada término de prazo, o Conde fazia nova “divisão inteligente” do tempo restante, chegando, desta forma, ao derradeiro mês de sua vida.
Um mês apenas!... Era, pois, preciso despedir-se dos familiares e amigos. Mandou carta a todos os nobres vizinhos, convidando-os para uma grande caçada. Em 25 dias, estavam todos reunidos no seu castelo. Foram três dias de intensa comemoração.
Restavam-lhe agora apenas dois dias!
“Não posso deixar sair meus convidados sem um banquete de despedida” — pensou o Conde. E marcou um monumental almoço para o dia 25 de outubro, seu último dia de vida!
Após o banquete, sentiu necessidade de descansar um pouco, para poder então fazer uma boa confissão. Já deitado, sentiu as primeiras dores da morte iminente, chamou um criado e, com voz cavernosa, mandou trazer depressa um padre.
O fiel servo correu ao vilarejo próximo, à procura do Pároco. Enquanto isso, o Conde Rodolfo — que desperdiçara 50 anos de prazo para preparar-se — começou a ver vultos movimentando-se em torno de sua cama, como que à espera do momento de levá-lo para o inferno. Ofegante, observava a ampulheta do tempo prestes a esgotar-se. Faltando apenas cinco minutos para meia-noite, ouviu o ruído da carruagem que se aproximava, com o padre.
Tarde demais!... Antes de entrar o sacerdote, soou o primeiro badalar dos sinos, anunciando um novo dia!
Desesperado, o Conde soltou um horrível brado e... acordou verdadeiramente. Com grande alívio, percebeu que estava diante do crucifixo enferrujado da capela em ruínas no meio da floresta, onde entrara para repousar poucas horas antes.
Tudo não passara de um sonho.
De um mero sonho, não! Pois o jovem Conde Rodolfo tomou a sério o misericordioso aviso. Daí em diante, seguiu decididamente o caminho da virtude e da devoção a Nossa Senhora. Pelo exame de consciência diário e pela confissão frequente, manteve-se sempre preparado para o último e mais importante dia de sua vida: o dia de seu encontro com Deus.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

O rei e o menino

Numa manhã de primavera, o rei resolveu fazer um passeio pelas ruas da capital. Pululavam-lhe na memória as tristes recordações do passado, no qual a morte visitara o palácio real. Primeiro foi a rainha, e pouco tempo depois, o príncipe, seu único herdeiro.
Enquanto contemplava as prósperas avenidas, repletas da população respeitosa e reverente à sua passagem, pensava que o fruto de sua honesta e sábia administração estava destinado a perecer após sua morte. Não encontrava em nenhum dos súditos e parentes as qualidades de espírito e a religiosidade indispensáveis para a salvaguarda de um reino cristão.
As densas nuvens que lhe turvavam a alma suavizaram-se um pouco à vista da catedral.
— Parai aqui, disse ao cocheiro, que quero rezar. Adentrando o sagrado recinto, o rei dirigiu-se à imagem de São José. Ali, brotou-lhe do fundo da alma uma prece:
— Ó bondoso pai de Jesus, a cujos pés vieram rezar, no decorrer dos tempos, também os meus antepassados. Entrevejo desde já as desgraças e desavenças que tomarão conta do reino após minha morte, caso eu parta desta vida sem deixar descendência. Vós, que tivestes sob vossa tutela o Rei dos reis e Senhor dos senhores, intercedei por mim junto Àquele que governa o universo.
Já no caminho de volta para o palácio, a carruagem dourada do soberano se deteve num cruzamento. Os olhos do monarca recaíram sobre um menino pobremente vestido que atravessava a rua. Impressionado pela semelhança que havia entre ele e o exherdeiro, mandou chamá-lo.
O pequeno aproximou-se timidamente e perguntou:
— Majestade, em que posso servi-lo?
— Senta-te ao meu lado, quero conversar contigo.
A princípio envergonhado por suas pobres e sujas roupas, o menino foi se esquecendo de sua miserável condição. Tão bondoso era o rei, e tão à vontade o deixara que sua atenção estava completamente voltada para o grande soberano.
— Como te chamas, e quem são teus pais?
— Chamo-me José, porque nasci no dia da festa desse santo. Quanto aos meus pais... eles morreram faz muito tempo. Eu moro com uma tia que não gosta muito de mim. Durante o dia eu peço esmolas, para aliviar um pouco as privações.
Diante desse menino frágil e necessitado, o rei discerniu um sinal do Céu.
— José, queres vir comigo para o palácio real, onde ocuparás o lugar do príncipe? Tu serás a partir de agora o meu filho, e quando Deus me chamar à Sua presença, tu serás o rei desta nação.
O pequeno menino abriu a boca, mas não conseguiu dizer nada. Aquele convite era completamente desproporcionado com sua humilde condição! Com muito esforço respondeu:
— Estou pronto para fazer a vossa vontade, meu senhor. Chegando ao palácio, o rei disse para toda a corte:
— Desejo que este menino seja meu herdeiro. Quando eu morrer, ele será o novo monarca. Levem-no para o quarto de dormir de meu falecido filho, vistam-no com suas roupas, ofereçam-lhe os alimentos que desejar, sirvam-no como fariam ao príncipe.
José foi sendo educado, tornouse moço e convivia de modo perfeito com o rei. Tudo corria com normalidade, porém no espírito do monarca nasceu uma interrogação: “Esse menino me quererá verdadeiramente bem? Ser-me-á agradecido pelo que recebe? Tornar-se-á digno de um dia dirigir meu reino? Ou será ele um ingrato que me agrada por interesses momentâneos? Para obter respostas seguras a essas indagações, vou submetê-lo a uma dura prova, pois se não o fizer, minha generosidade pode significar grande estultice”.
No dia seguinte o rei pôs em prática a dura prova para o príncipe. Passou a fingir que não lhe demonstrava a mesma amizade, que não o compreendia bem. Olhava-o com indiferença, e até com certa distância. Concedia-lhe audiências curtas, prestava-lhe pouca atenção, evitava-o em favor de coisas menos importantes. Chegou a ponto de conversar com terceiros, na presença dele, sobre reis viúvos e sem filhos que casaram novamente, tiveram prole e asseguraram sua descendência.
— Quem sabe se eu sigo o exemplo deles, contraio outras núpcias e tenho um herdeiro do meu próprio sangue?
Ao cabo de vários meses neste regime, o rei mandou um nobre da corte experimentar José.
— Não sei o que se passa, príncipe José, mas sinto nosso soberano muito mudado. Percebo que ele já não te devota o mesmo afeto de antes. Creio que para ele, já não és mais seu filho.
— Sim, nobre marquês, hei de concordar que o rei está muito sério e formal. Entretanto, não faz parte de seus direitos tratar-me conforme queira? Eu recebi tanto dele! Ainda que ele me tire tudo, eu o servirei a vida inteira!
Sem demora o marquês foi levar a resposta ao rei. Ficou assim comprovada a lealdade do coração do príncipe, o que muito consolou o monarca. Contudo, ele ainda precisava de uma derradeira demonstração de fidelidade do príncipe.
Certa madrugada, mandou acordá-lo e trazê-lo à sua presença.
— Preciso incumbi-lo de uma missão perigosa e confidencial. Em país distante há um preso que espera uma mensagem minha. Nesta noite mesmo, terás de sair disfarçado do palácio, viajar para lá, dizer que és meu filho, deixar-te prender e seres conduzido ao mesmo cárcere, para assim poder transmitir o meu recado à pessoa em questão.
O jovem, embora surpreso, não hesitou em responder:
— Meu senhor e pai, farei isso com todo o empenho. A que horas devo partir? Como se chama o preso? Qual é a mensagem que Vossa Majestade quer que lhe seja transmitida?
O rei deu ao príncipe as instruções necessárias e acrescentou:
— Você tem uma hora para estar pronto. Diga-me “até logo” e vai-te embora.
O rapaz se inclinou e se retirou.
Na hora exata, apresentou-se disfarçado diante dos guardas à porta do palácio. Mas, para sua surpresa, eles o impediram de sair, dizendo:
— O rei ordena que voltes para teu quarto! Ele retornou e o monarca o acolheu com transbordamentos de agrado. Estava assegurada a sucessão ao trono naquele reino mítico e maravilhoso...
* * *
Foi um sábio quem compôs essa história, à qual podemos dar a seguinte interpretação: tendo Deus criado os anjos para reinarem no Céu, olhou com tristeza os tronos que os seguidores de Lúcifer deixaram vazios. Chamou, então, os pobres homens para ocuparem aqueles lugares esplendorosos, muito acima dos seus merecimentos; e a fim de comprovar o grau de amor e gratidão de cada um, decidiu submetê-los a provações.
Se nelas formos fiéis, pelos rogos misericordiosos de Maria Santíssima, Nosso Senhor nos introduzirá no Paraíso, dizendo: “Servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Vem regozijar-te com teu senhor” (Mt 25, 21).

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

A serpente de bronze

Suscitado por Deus para libertar o Povo Eleito da escravidão no Egito, Moisés foi sem dúvida dos maiores homens que a História conheceu.
Para realizar essa missão humanamente impossível, realizou prodígios como ninguém. Para vergar o Faraó, desencadeou as dez pragas. Na condução do povo à terra prometida, abriu as águas do Mar Vermelho, fazendo os hebreus atravessarem a pé enxuto; fez brotar água de rochedos; cair maná do céu, culminando tudo com as Tábuas da Lei, em que o próprio Deus lhe transmitiu os Dez Mandamentos.
Entretanto, o povo israelita — testemunha e beneficiário de todos esses prodígios — não correspondia com gratidão à bondade divina. Na peregrinação de quarenta anos pelo deserto, com muita frequência duvidava de sua infinita bondade ou de sua onipotência, e punha-se a murmurar e reclamar contra os céus e Moisés.
Dúvidas, desconfianças e murmurações
Assim, apenas três dias após a milagrosa passagem do Mar Vermelho, começaram as murmurações — “Que havemos de beber?” (Ex 15, 24) — pois eram amargas as águas de Mara, onde chegaram. Moisés, então, por indicação do Senhor, jogou na água um madeiro que a transformou em água doce.
Decorridos menos de dois meses, reiniciaram as dúvidas e reclamações: “Oxalá tivéssemos sido mortos pela mão do Senhor no Egito, quando nos assentávamos diante das panelas de carne e tínhamos pão em abundância! Vós nos conduzistes a este deserto, para matardes de fome toda esta multidão” (Ex 16, 3). Em resposta, Deus enviou-lhes uma nuvem de codornizes e, a partir desse dia, fez cair do céu todas as manhãs o maná, saboroso e nutritivo, do qual, durante 40 anos, se alimentaram 600 mil homens aptos para a guerra, além das mulheres e crianças.
Na etapa seguinte da caminhada, nova recaída: “Por que nos fizeste sair do Egito? Para nos fazer morrer de sede com nossos filhinhos e nossos rebanhos?” Então dirigiu Moisés esta prece ao Senhor: “Que farei a este povo? Mais um pouco e irão apedrejar-me” (Ex 17, 3-4).
Manifestações de desconfiança, de murmuração e de espírito de revolta eclodiam, por assim dizer, em cada etapa do percurso. Somente contra Moisés? Não, contra o próprio Deus: “Ele ouviu as murmurações que proferistes contra Ele. Nós, porém, quem somos? Não é contra nós que murmurastes, mas contra o Senhor” (Ex 16, 8).
Deus, paciente e misericordioso, atendia sempre às súplicas de seu Profeta e perdoava o povo “de dura cerviz”. Às vezes, para bem desse mesmo povo, mandava-lhe uma salutar punição.
“Enviou serpentes ardentes que picaram e mataram muitos”
Um desses castigos foi o das mortíferas serpentes.
Logo após ser favorecido pelo Senhor dos Exércitos com uma vitória contra os cananeus, o povo hebreu partiu em direção ao Mar Vermelho. No caminho, perdeu a coragem e recomeçou a murmurar mais uma vez contra Deus e Moisés: “Por que nos tirastes do Egito, para morrermos no deserto onde não há pão nem água? Estamos enfastiados deste miserável alimento” (Nm 21, 5).
O Senhor, então, enviou contra eles serpentes ardentes que picaram e mataram muitos. Ante a evidência do desagrado divino, reconheceram seu pecado e recorreram à intercessão de Moisés: “Pecamos, murmurando contra o Senhor e contra ti. Roga ao Senhor que afaste de nós essas serpentes” (Nm 21, 7).
O Profeta intercedeu por eles e foi prontamente atendido, como sempre. Deus, porém, em vez de eliminar as serpentes, querendo dar uma grande lição moral ao povo, disse a Moisés: “Faze para ti uma serpente ardente e mete-a sobre um poste. Todo aquele que for mordido, olhando para ela, será salvo” (Nm 21, 8). Moisés mandou, pois, fundir uma serpente de bronze e fixá-la num poste. E, diz o Livro dos Números, “se alguém era mordido por uma serpente e olhava para a serpente de bronze, conservava a vida” (21, 9).
Prefigura de Jesus e de Maria
Portanto, para quem recebia a picadura mortal da cobra, não adiantava recorrer diretamente a Deus: “Senhor, salva-me!” Também não resolvia seu caso pedindo ajuda a Moisés. Não... Se não queria morrer, era indispensável olhar para a serpente de bronze erguida no poste.
Por quê? Deus poderia tudo fazer diretamente, sem intermediário algum. Mas, em sua infinita Sabedoria, quer Ele servir-se de intercessores e de símbolos, como Moisés e a serpente de bronze. Esta simboliza o Divino Redentor, conforme afirma o Evangelho de São João: “Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim deve ser levantado o Filho do Homem, para que todo homem que n’Ele crer tenha a vida eterna” (Jo 3, 14).
E é um formoso símbolo também da Virgem Maria, Co-redentora do gênero humano e Medianeira de todas as graças, para quem devemos olhar em todos os momentos da vida. Isto nos ensina, com palavras de fogo, o grande São Bernardo, exortando-nos a invocar Maria, a Estrela do Mar:
“Se o vento das tentações se levanta, se o escolho das tribulações se interpõe em teu caminho, olha a estrela, invoca Maria.
“Se és balouçado pelas vagas do orgulho, da ambição, da maledicência, da inveja, olha a estrela, invoca Maria.
“Se a cólera, a avareza, os desejos impuros sacodem a frágil embarcação de tua alma, levanta os olhos para Maria.
“Nos perigos, nas angústias, nas dúvidas, pensa em Maria, invoca Maria.
“Seguindo-A, não te transviarás; rezando a Ela, não desesperarás; pensando n’Ela, evitarás todo erro.”


quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

As três perguntas do Imperador

Sentado no seu trono, Carlos Magno preside à reunião do Conselho. No final, apresenta três perguntas. Quem lhes der resposta acertada receberá como prêmio uma imensa fortuna.
“ Senhores duques e barões — diz o grande Imperador de barbas brancas — eis que meu fiel amigo e vassalo Teudegúndio entregou piedosamente sua alma a Deus, deixando na Terra apenas sua lembrança e as saudades naqueles que o conheceram. Não tendo filhos, e havendo-o precedido sua esposa na mansão dos justos, seus bens e suas terras estão doravante nas minhas mãos; e eu vos reuni hoje aqui para determinar quem de vós merece receber esta herança. Vou fazer-vos três perguntas. Quem acertar perfeitamente as três, ficará com a herança.
“Ouvi, pois, a primeira pergunta: onde está o centro do mundo?”
Os duques e barões entreolharam-se, estupefatos. Nenhum deles saberia dizê-lo com precisão. Mas Carlos continuou:
“Escutai agora a segunda: quanto achais vós que eu valho?”
O silêncio, na sala do Conselho, se fazia cada vez mais angustiante. Quem poderia responder a tão difíceis perguntas?
“A terceira pergunta é: o que estou pensando?”
Os presentes se agitavam nas cadeiras... “Impossível!”, exclamaram vários. “Ninguém conseguirá!”, afirmaram outros. “São perguntas que não têm resposta!”
“Senhores, concedo-vos uma semana para refletir” — cortou o grande Carlos, sem pestanejar.
Encerrou-se a reunião, todos se retiraram.
 * * *
Agreldácio, o mais jovem dentre eles, acabava de ser nomeado barão após a morte de seu pai. Pobre, sem terras nem bens, morava sozinho e sobrevivia apenas dos frutos da horta cuidada por um jardineiro, jovem como ele.
De volta a seu pequeno castelo, parou diante de uma linda imagem de Nossa Senhora que reinava no jardim. Dirigiu-lhe uma prece filial, dizendo que, caso assim o quisesse, Ela poderia colocar ao alcance dele a herança desejada.
Terminava de fazer o sinal-da-cruz, quando se aproximou o jardineiro.
— Senhor barão, andais preocupado... em algo posso ser-vos útil?
Nosso barão contou-lhe o que se passara no Conselho. O jardineiro não pareceu embaraçado com as perguntas.
— Não vos preocupeis. Temos uma semana para pensar... Com vossa permissão, hei de fazê-lo. Creio que poderemos encontrar uma boa solução.
Estas palavras, ditas com segurança, reanimaram Agreldácio.
Passada uma semana, no dia marcado pelo Imperador, quando Agreldácio preparava-se para sair, viu chegar seu jardineiro, sempre tranquilo, mas com um brilho especial nos olhos. Curiosamente, tinha ele nas mãos uma esfera de pedra e um manuscrito de um trecho do Evangelho. Após cumprimentar o patrão, disse-lhe:
— Senhor barão, peço que façais tudo o que vos disser, pois tenho boas esperanças no sucesso de vossa empresa.
Em poucos minutos, o inteligente jardineiro expôs seu plano. Pouco depois saíram ambos a cavalo, rumo ao palácio do Imperador.
* * *
Na sala do Conselho reinava grande expectativa.
Após tratar de vários assuntos referentes ao reino, indagou Carlos a respeito das perguntas que tinha feito na semana anterior. Seguiu-se um silêncio, misto de respeito e vergonha. De repente, do mais afastado dos assentos levantou-se o mais jovem dos presentes.
Dissimulando sua surpresa com um amável sorriso, Carlos procedeu ao interrogatório:
— Senhor barão, dizei-me a resposta à primeira: onde está o centro do mundo?
— Majestade, se é verdade que o mundo é redondo, qualquer ponto pode ser seu centro; logo, quanto mais o lugar onde se encontra Vossa Majestade... — respondeu o moço, com uma calma inusual em sua idade.
Um burburinho de aprovação percorreu o auditório. Os sábios do Império se entreolhavam com admiração. Contente, prosseguiu o Imperador:
— Senhor barão, respondei-me, pois, à segunda pergunta: quanto achais que eu valho?
— Majestade, se nosso Salvador, Jesus Cristo, quis ser vendido por trinta moedas, certamente não valereis vós mais de vinte e nove... — retrucou o jovem com igual serenidade.
A estupefação encheu o auditório. Ninguém tinha pensado nisto! A resposta era perfeitamente válida! Todos se perguntavam quem era esse jovem. Mas ainda faltava uma pergunta por responder... a mais difícil!
— Senhor barão, respondestes bem às duas primeiras perguntas, e em verdade admiro-me de vossa justeza. Porém, falta-vos uma, e me admiraria ainda mais que a acertásseis. Dizei-me, pois, agora: o que estou pensando?
Na sala do Conselho, a tensão atingiu seu auge... Seria este jovem capaz de penetrar no pensamento do Imperador?
Tirando com graça o chapéu e o manto, deixando assim aparecer o traje de seu ofício, o jovem respondeu com desenvoltura:
— Majestade, vós pensais que sou o Barão Agreldácio... Entretanto, não sou senão seu jardineiro. E humilde servidor vosso — acrescentou, fazendo uma profunda reverência.
Um estrondoso aplauso quebrou o silêncio que até então os assistentes tinham logrado manter. A seguir, o jardineiro terminou pedindo ao Imperador que concedesse a seu amo a herança da qual se tinha tornado merecedor por suas respostas. De bom grado, o generoso Imperador acedeu.